Cultura X Entretenimento, por Mutti Kirinus

O sentido da palavra Cultura é amplo e por carregar em si uma beleza e um glamour é presença constante nos discursos e nas conversas de maneira geral.

De uma certa forma, em um sentido amplo, poderíamos dizer que cultura é tudo aquilo que passou por um processo humano. Nesse ponto, os trajes, comidas, jogos, trabalhos, crenças, enfim, tudo aquilo que não dá em árvore, que não é estritamente natural, é cultura. Neste sentido amplo não é errado dizer que valorizando qualquer atividade humana está se valorizando a cultura.

Mas quando afirmamos que alguém é uma pessoa culta, ou que hoje vivemos uma falta de cultura, ou precisamos de mais cultura para nossos jovens, não estamos usando essa palavra no mesmo sentido amplo que mencionamos. Isto porque é preciso entender, diferenciar e utilizar o sentido correto da palavra cultura conforme o contexto. Quando falamos de apoio à Cultura, de Centro Cultural, de Secretarias de Fomento à Cultura, estamos utilizando a palavra cultura no seu sentido mais específico, e mais nobre na minha opinião. Qual seja, nos referimos aos bens culturais, os patrimônios históricos da humanidade, presente nas artes e deixadas como um legado a ser preservado e difundido entre nossos pares e principalmente para as novas gerações.

Desse modo, um show pode ter um caráter cultural, de preservação e difusão de um patrimônio histórico imaterial, ou pode também ser mero entretenimento. No sentido amplo ambos são parte da Cultura, mas apenas no primeiro caso ele é genuinamente cultural.

Lembremos que a ‘cultura’ de massa, ou de entretenimento, muito embora tenha muitos adeptos pelo seu valor comercial, não necessariamente agrega ou contribui culturalmente para a sociedade. Ela ainda terá que passar pelo crivo do tempo e assegurar sua validade para além de um sucesso momentâneo e comercial.

Não necessariamente algo para ser cultural neste sentido mais específico precisa ser velho ou antigo. Mas ele precisa dialogar com esse legado. Por exemplo, uma letra de uma canção precisa ter poesia. Os versos dos poetas serão sempre novos, mas quem tem o bom hábito da leitura literária sabe diferenciar um poema de algumas rimas pobres, devido justamente a esse legado que nos foi deixado.

A evolução da humanidade através das artes também exige que toda forma de arte nos leve além, e não simplesmente nos mantenha distraídos. Dessa mesma forma um poema de uma canção deve modificar nosso ser, edificar conexões, ou romper barreiras que existem em nós ou na sociedade. Como diz Mário Quintana: um poema que não te ensina a viver e não te prepara para a morte é um mero chocalho de palavras.

Não sei se me fiz entender, mas um chocalho no sentido amplo de ‘cultura’ pode ser considerado um objeto cultural, mas somente uma música-arte, um poema verdadeiro, um livro, uma peça de teatro ou dança, o ensino das artes, etc, merecem no sentido mais nobre da palavra serem chamados de Cultura.

Mutti

Mutti

Helmuth A. Kirinus é mestre em Filosofia pela UFPR, formado em gestão cultural e músico. Atualmente coordena 8 projetos via lei Rouanet de incentivo à cultura e 4 via Sistema Municipal de Desenvolvimento da Cultura de Joinville. É professor de violão e coordenador da Escola de Música Tocando em Frente em Itapoá. Atua também como representante técnico do setor Comunicação e Cultura dos projetos do Ampliar pelo Porto Itapoá.

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