
“Gestão Cultural como trabalho”, por Mutti Kirinus

Em conversa com uma amiga, parceira de projetos, recebi a informação de medidas restritivas para o trabalho de gestão cultural na cidade de Joinville. O mesmo aconteceu recentemente em Itapoá no edital da lei Aldir Blanc.
A ideologia por trás dessas atitudes governamentais é que o artista tem que trabalhar por amor e as iniciativas de empreendimentos culturais e sua gestão sejam também voluntárias em prol do bem social que essas ações promovem. Ora, já foi constatado aqui em Itapoá, e realmente é uma realidade, assim também na maior parte das cidades, que a maioria dos artistas não possuem a expertise de escrita, formatação, execução e prestação de contas de projetos culturais. Sabendo-se disso talvez a ideia por trás desses impeditivos seja realmente de travar a roda da cultura, o que deixa muitos projetos de fora, e muitos artistas também. E deixa os trabalhadores de gestão cultural também sem trabalho.
No entanto, a remuneração pelo serviço de gestão da Cultura não tira o benefício social de qualquer ação cultural, nem o artista vai perder o amor à arte se receber um bom cachê.
Essa restrição obriga o artista a ser o seu gestor e produtor cultural, o que não é ruim, mas muitas vezes nem é uma possibilidade diante das demandas do fazer artístico, e mesmo sendo possível, o artista terá que dividir o seu tempo entre a manutenção da sua arte e a escrita de projetos e gerenciamento dos mesmos.
O que acontece é que a falta de valorização do fazer artístico que produz algo, mesmo que no âmbito simbólico e não pragmático, reflete na desvalorização da gestão do e do fazer artístico. E a grande dificuldade de um discurso ideológico e intensamente propagado, é que ele permanece na mente de qualquer pessoa que não faz uma avaliação crítica sobre ele. E por falta de hábito ou de tempo, aceitamos muitas ideias e condutas dessa forma. Isso pode fazer com que a própria classe artística defenda essas ideias e onde se enxergaria aliados, os gestores culturais e o benefício dos seus trabalhos, esses se veem rotulados como usurpadores do fazer artístico, o qual, sem esse trabalho, fora as raras exceções em que o artista é também um especialista em gestão e produção cultural, este nem sequer teria a oportunidade de acontecer através das portas que a gestão cultural consegue abrir.
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Helmuth A. Kirinus é mestre em Filosofia pela UFPR, formado em gestão cultural e músico. Atualmente coordena 8 projetos via lei Rouanet de incentivo à cultura e 4 via Sistema Municipal de Desenvolvimento da Cultura de Joinville. É professor de violão e coordenador da Escola de Música Tocando em Frente em Itapoá. Atua também como representante técnico do setor Comunicação e Cultura dos projetos do Ampliar pelo Porto Itapoá.
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